segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

religião

eu me pego pensando em toda aquela santidade dela. em todos os "meu deus" e "jesus cristo". se realmente tudo aquilo é verdade, se realmente aquilo sai da boca dela com clareza e real vontade. muitas vezes acho que é para impressionar o resto das pessoas e passar alguma identidade e que no fim não passa de um cobertor para os erros que ela acha que comete. todo o pudor que ela veste como se fosse a sua última roupa, toda vergonha que sente das verdades que lhe falam, todo o prazer que lhe negam e ela concorda, tudo isso um dia vai acabar, não sei se bem ou mal. mas sinto que ela quer que acabe, que todos os transtornos da culpa que a deixaram sem durmir e tudo que ouviu e leu sobre seus pecados tenha um fim. e que ela finalmente sinta prazer sem culpa, sem encargos e sem olhos vigiantes. até lá também espero esse fim com afinco e não consigo também ficar aflito por ela. uma vida mal vivida que se esconde por trás de um sorriso de menina.

sábado, 11 de dezembro de 2010

certeza

eu tenho a grande certeza de que deus é um imenso filha da puta. dá rabo grande pra menina crente, faz chover buceta em terra de viado e ainda quer que a gente tenha senso de humor. nessa chuva de pica não boto a minha bunda na goteira.

domingo, 28 de novembro de 2010

recusa

eu vou te dizer algo, sabe porque me recuso a acreditar em um deus? porque uma vida dada por um deus de nada vale, onde seus êxitos e fracassos nada mais são do que a boa vontade ou o sadismo de 'algo maior'. me recuso a acreditar que tudo que consegui até o presente momento apenas foi conquistado porque tal 'algo maior' me deixou conquistar, como se de nada valesse o meu esforço. me recuso também jogar a culpa dos meus erros em algo que não pode retrucar, como se as minhas chances desperdiçadas fossem passíveis de aceitação porque 'algo maior' quis assim. acreditar em um deus é esquecer de suas responsabilidades e apenas sobreviver. engana-se quem acha que sobreviver é o mesmo que viver. para mim, a vida é sem graça acreditando em um deus. para mim, acreditar em um deus é não ter vida.

amargo

eu lhe digo caro amigo que a vida fica amarga com o tempo. a paciência se esgota e os gostos também. o amargo retoma e fica. não há mais a sensação ruim do amargo, pois ela agora é reconfortante. todos os gostos que na infância eram mal vistos hoje são os mais vividos. experimentar o whisky sem gelo não é mais tarefa árdua, mas sim novo vício. os goles na cerveja mais lascinante agora são como beber a água mais refrescante. um brinde ao amargo é sempre feito. os cheiros, os sabores, os toques e os beijos. todos eles amargam do melhor jeito possível

razões

eu o vi com seu mundo desmoronando e ele não estava nem aí. podia analisar criticamente cada motivo que o fizera desabar. cada pequeno aspecto. se tornou tão racional que fazia força para tentar sentir alguma emoção. em vão, pois em seguida entendia o porque na emoção. não se tornou frio por causa disso, mas apenas sábio. sábio de que tudo tem um motivo e que não há porque se desesperar por isso. sábio para agir diferente das próximas vezes. um sábio solitário

sábado, 16 de outubro de 2010

você

eu não deveria ter te dado aquela chance. não mesmo. achando que voce faria o contrário do que sempre faz. você fez o mesmo. a mesma birra, a mesma idiotice. ao invés de virar pra mim e perguntar porque eu não falava com você, você fez justamente o contrário. falou pra todos. ninguém em especial. nem mesmo pra mim era aquele recado. você não queria me atingir. nem sequer pensou nisso. aquilo era só seu. era o seu desabafo. como sempre. você escolhe alguém relativamente perto de você. não precisa ser nem conhecido, mas apenas diametralmente perto. quem está a alguns centimetros e joga. joga tudo. e a pessoa escuta achando que é importante. e com o tempo ela acha tudo mais e mais importante porque você dá confiança pra ela. você começa a interagir com a pessoa. a pessoa acha que você compartilha as mesmas angústias e alegrias que ela. e num só momento tragi-mágico você se revela. mas a pessoa ainda te olha como fosse ainda importante. um vai tomar no cu bem grande pra quem você era só amores. e sem sentido. porque diametralmente a pessoa que estava perto não mais era o ouvinte de suas angústias e sim o causador delas. e o pior é que nem era com você. da mesma forma que você despejava a tristeza, você despeja a raiva. tudo. em cima de quem quer que seja. porque você é isso, apenas um berreiro sem fim. sem um fim especial. é apenas a questão de distância. são os centímetros. não interessa para você as suas relações com quem grita, esperneia ou chora. ou o porque fazer isso para ou com aquela pessoa. você apenas o faz. não há nada de especial nisso. ninguém é especial para você. porque você é egocêntrica. só se interessa por você. e apenas tudo que você diz tem sentido. e você faz as pessoas acreditarem nisso até o fim. que você é a dona da verdade. que você é o centro de tudo. mas você se engana se acha que é uma pessoa egocêntrica porque é. na verdade não, você o é porque não cresceu ainda. você é ainda uma criança que esperneia e conta pra todos o que quer e não interessa se eles não querem saber. você apenas conta. é parte de um jogo sujo infantil. o único que você sabe jogar. você é apenas uma criança remelenta e que se acha espertalhona. esse é o pior de tudo. num mundo de adultos você ainda não cresceu. mas você acha que cresceu. mas você não tem ninguém em especial. qualquer pessoa perto é um adulto, um ouvinte, um confidente para as sua agruras infantis. ninguém tem importância se não ouvir os seus lamentos, sejam bons ou ruins. você se julga importante. julga suas cismas, neuras e gritarias como questões de primeira ordem. como as mais importantes. mas você é uma criança, nada que você fala tem importância. não posso nem dizer para você crescer e aprender isso. já passou da hora. você é uma menininha debilóide num corpo de adulta. você não tem mais idade para crescer. você será isso pra sempre. até se tornar uma velha chorona. uma velha criança. esse é o seu problema, você nunca vai crescer.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

desde os 12

eu ia como sempre pra droga do ponto de ônibus. droga não. sejamos sinceros. para merda do ponto de ônibus. a calçada estreita e sempre com água fedendo. eu não sei qual era o problema daquela rua pra ter aquelas valas todo dia. verão ou inverno, dia ou noite, chuva ou sol. sempre as malditas valas negras perto do meio-fio. era uma rua que passei quase minha vida inteira mas sempre rezei para não morar lá. mas era mais um dia indo pra aquela merda de cidade. acho que devo ser o cara que mais odeia niterói. mas me rendeu alguma coisa. alguma, não muita. mas de certa forma aquele dia e alguns outros compensavam. depois que mudaram o ponto que eu pegava de lugar eu precisei ir até aquela rua onde ficava o ponto final. e de certa forma isso foi bom. um dia, já um dos últimos nos quais eu precisava pegar aquele maldito ônibus, eu a vi. ou aquilo. ou a parte dela. ou ela toda. o que importa é que vi. confesso que se não fosse pela mudança no lugar do ponto eu nunca veria ela em pé. no máximo quando ela saísse do ônibus. mas foi um daqueles momentos interessantes. que levantam a sombrancelha e que te estalam a imaginação logo de manhã. a calça jeans apertada. como se não sobrasse espaço para nenhum pêlo debaixo respirar ou se quer pudesse arrepiar. e isso era apenas uma das coisas interessantes. o corte baixo da calça na altura da cintura. a parte de trás arrebitada. quando ela virou eu não acreditei. era uma das bundas mais perfeitas que eu já tinha visto. não tinha como. ela beirava à perfeição. não sei se era só a bunda em si ou a conjunção de fatores, mas aquilo era algo que se podia ficar olhando por horas sem cansar. acho que na verdade foi a conjunção de fatores. a calça, a cintura, as coxas, a bunda. tudo. mas ela não era um espetáculo de beleza. pelo menos não da primeira vez que eu vi. primeiro foi a bunda. mas depois notei o resto. os cabelos um pouco longos. confesso que tingidos de uma forma ruim, mas bem cortados, fazendo um "V" no meio das costas. era aquele loiro quase branco embaixo de um castanho escuro. coisa que eu via as meninas fazerem quando eu tinha lá pros meus 12 anos. e mais de 10 anos depois confesso que apesar do resultado não muito bonito, me atraiu. lembrou-me de como as meninas da minha idade pintavam o cabelo daquele jeito para parecer natural. são "luzes". não há nada de natural em cabelos de cor diferentes na mesma cabeça. mas de certa forma esse paradoxo de beleza mostrava que as meninas dos meus 12,13 anos estavam crescendo. as mães deixavam pintar os cabelos, fazerem as unhas. e enquanto nós mal tínhamos um pentelho ou outro, todas elas já se depilavam com maestria. aquele cabelo me lembrou as aulas de educação física, os começos de ano letivo e as provas finais em novembro. todos os momentos onde as meninas não tinham outra escolha a não ser andarem de shorts míudos ou saias curtas. era o deleite dos proto-homens que as viam desfilar. o nariz dela não era bonito, era grande. não um grande fino, mas um grande meio batatudo. era estranho mas cabia bem no rosto dela. o queixo rígido, meio quadrado, dava um ar de serenidade. suas sombrancelhas pretas denunciavam o paradoxo das madeixas com luzes. seus olhos negros também faziam esse favor de desmentir sua beleza "natural". seu sorriso quando a via conversando algumas vezes com colegas dentro e fora do ônibus era bonito. eram dentes pequenos e bem alinhados. quando sorria tudo combinava. mesmo o nariz dissonante. assim como as meninas da pós-infância teve seus dentes consertados. era visível que ela tinha usado aparelho. que sua mãe pagava meio salário-mínimo por mês para um espertalhão apenas trocar borrachinhas do tamanho de cabeças de fósforos. e isso foi toda uma geração, inclusive eu. os doutores de nossas bocas, santos para nossas mães e mártires para nossos pais. para os usuários do calabouço ortodontológico todos os phds em cáries eram judas. por mais estonteantes que ficassem de branco. mas nem tudo nela se resumia à bunda. podia muito bem se resumir, mas não. ela não era gorda ou magra de mais. era no ponto. tinha suas formas e jeitos, mas sem ser muito preciosa ou muito despreparada. a bunda era magnífica. não tinha mais do que 90 cm de quadril e isso era um fato. não era muito grande ou muito pequena. e não me atrevo a chamar de média. era simplesmente perfeita. o jeito que mexia quando andava, o jeito que parava enquanto esperava aquela maldita condução. o jeito que passava na roleta fazia quem a notasse, desejasse ser aquele maldito catalogador de passageiros. ter aquelas duas bandas para si era desejo de qualquer um que a olhasse. a visse caminhar. a acompanhassem com o olhar. era sublime. tudo aquilo que se mexia. a bunda. o rosto. o queixo. o nariz. o cabelo. e ela sabia disso. tudo aquilo que nós imaginávamos ela já tinha planejado. a bolsa-mochila pequena em um ombro para deixar notarem o cabelo e a subsequente majestosa retaguarda. e o livro de anatomia no outro braço para mostrar que ela não era só um pedaço de carne. que ela tinha suado seus neurônios para poder ter aquela bunda e não o contrário. ela era respeitosa e respeitada. uma menina inteligente com uma bunda maravilhosa. o livro de anatomia humana mostrava que ela escolheu o caminho mais díficil. talvez a ondontologia ou quem sabe a medicina. honrando a preocupação dos pais e de certa forma homenageando aqueles que deixaram-na no ponto certo de enlouquecer a todos. estudava em uma universidade que poucos podiam entrar e que mostrava que ela não era mais do que uma bunda, apesar de ter planejado de forma absoluta que seria lembrada em boa parte por isso. ela cresceu e cresceu a bunda, o intelecto e a compreensão de que os dois devem andar juntos para que ela parecesse fabulosa e não uma qualquer. ela sabia que quando crescesse deveria ser aquilo que todos imaginavam nas tardes de quarta e quinta depois das aulas de educação física. um mulherão. uma página dupla de volúpia. ela fez isso tudo. conservou os cabelos de seus 12 anos, manteve com orgulho os defeitos que em nada atrapalhavam, se cuidou externa e internamente. e ela virou aquela que esperava no ponto de ônibus. sua bunda perfeita, seu sorriso inexecrável, seus livros pesados, seu andar seguro. ela era tudo isso. desde os 12. ela era exatamente como sonhávamos.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

campainha

eu sempre me perguntei o que aquela campinha fazia. 3 meses na frente dela. não sei se alertava algo para alguém nos andares de cima, se chamava a atenção daqueles no laboratório, se soava algum alarme do lado de fora do prédio. ou talvez fosse apenas um interruptor de luz que foi trocado às pressas e colocado no lugar de uma campainha. não sei se foi proposital. se a pessoa que fez tenha pensado nisso. ter pensando em deixar alguém curioso. mesmo que tivesse apenas sido um fato e não um objetivo ter posto uma campainha no lugar de um interruptor, certamente pensou que iria causar algumas confusões. todos nós pensamos nisso quando fazemos algo com pressa. sem pretensão nenhuma agimos tendo alguma. é engraçado. como sentar em um ônibus perto da janela e estar com as pernas inconscientemente abertas, fazendo com que ninguém possa sentar do seu lado. ser dono daquele espaço sem pretender sê-lo. mas aquela campainha sempre intrigou e por esse mistério sempre preferi não perguntar a ninguém para que ela servia.

domingo, 8 de agosto de 2010

sentido

eu nunca me dei bem com aquela menina. não sei porque. e ela também não se dava comigo. e ela também não sabia por que. por alguma razão não nos bicávamos. por anos a fio. nada. nenhuma palavra amiga. nenhum gesto de carinho. nem de indiferença. só implicâncias. tinhamos milhares de amigos em comum. era quase impossível de por um tempo não nos vermos pelo menos uma vez por semana. mas nada disso adiantava. não nos cumprimentávamos. ficávamos nos implicando toda vez que podíamos. não nascemos de forma alguma para aturar um ao outro. até que um dia saímos e notei que todos tratavam ela com um certo apreço a mais. estranhei. não fosse o fato de não nos bicássemos, mas ela era bem chata às vezes e a maioria de nosso amigos não à levava a sério. coisa que eu sempre fiz com extremeza. mas aquele dia era diferente. mandaram recados, consolavam-na, conversavam baixo, se importavam com ela e de todas as formas ela tinha alguém sempre do lado dela. estranhei muito isso. mais do que deveria. até porque desgostava dela mais do que os outros. me atentando um pouco mais me liguei e descobri. a mãe dela tinha morrido. é uma bosta, lógico. a menina deve ter ficado arrasada. perder uma mãe quando se tem pouco mais de 20 anos é uma barra. realmente uma merda. pensei logo na minha e no quanto perdê-la seria ruim. apesar de todas as pessoas um dia morrerem. é uma foda. te fode a vida toda. você perde o chão. não me contive em saber que ela morreu e comecei a me perguntar se teria sido de câncer, batida de carro, diabetes, coração e todas aquelas coisas óbvias. fui e perguntei a um amigo. ele me disse que tinha sido depois de uma cirurgia. que merda, eu pensei. ela tinha um problema, foi tentar corrigir e morreu. devia ser algo relacionado com câncer, batida de carro, diabetes, coração e etc. meu amigo virou e disse que não foi nada disso. foi uma lipoaspiração. complicações depois da cirurgia mataram a mãe da menina. que modo estúpido de morrer. uma forma tão imbecil. por vaidade. morrer por vaidade. que merda. depois disso encontrei com a menina. ela viu que eu não estava com a mesma cara de quem ia implicar com ela e nem ela comigo. a gente não sabia porque não se bicava. nunca soubemos. quando a vi, fui andando em direção a ela e ela sabia que eu ia falar alguma coisa sobre o que aconteceu, porque era muito estranho o jeito que eu estava indo até ela. eu sabia disso, ela sabia disso. fiquei de frente pra ela. ela me olhou e eu olhei pra ela. num instante depois de quase 10 anos sem sabermos porque, eu dei sentido à nossa implicância toda e falei pra ela: sua mãe é uma idiota. me senti aliviado. depois de algum tempo tudo fazia sentido. após tanto tempo ela também deve ter se sentido aliviada. ela tinha uma razão pra me odiar. e eu pra implicar com ela. finalmente nós nos daríamos de alguma forma honesta e compreensível. dali em diante nos odiávamos e sabíamos porque. porque a mãe dela era uma idiota.

sábado, 7 de agosto de 2010

seis

eu hoje acordei assustado. são 6 anos sem te tirar da cabeça. são 6 anos volta e meia lembrando os bons momentos. tudo aquilo que a memória não esqueceu ainda está nesses 6 anos. tudo que passamos de bom e ruim. tudo que consigo lembrar. os pequenos cheiros. os pequenos gestos. as pequenas palavras. tudo ainda soa como ontem. como hoje. não são 6 anos. não é tanto tempo assim. 72 meses. uma vida. uma criança. são 6 anos. como posso ainda lembrar não sei. não sei se pra você ainda é vivo como é pra mim. não sei. provavelmente não faz tanto sentido pra você como pra mim. não sei se daqui a um tempo vou lembrar. por outros 6 anos. não sei com quem falar isso. na verdade estou é falando com as paredes. há 6 anos.

pescoço

eu viajei mais uma vez. não foi bom nem ruim. eu não esperava nada. de ônibus. sempre de ônibus. acho que nunca vou andar de avião. apesar de odiar ônibus. no ônibus tinha esse cara sentado na minha frente. alto, magrelo, fumava. eu reparei que ele tinha muita espinha na cara. mas algumas pessoas tem, fazer o que? depois eu reparei que ele tinha uma espinha no pescoço. e não era pequena. estava inflamada, feia, pedindo pra estourar. fiquei enojado na hora. ela era muto grande. e estava num lugar muito estranho. o cara devia se envergonhar dela bastante, mas sabia que não era e a primeira e nem a última vez que ela ia aparecer no seu próprio pescoço. pra mim ele era um pobre coitado e ao mesmo tempo algo extremamente grotesco. na medida que a viagem foi passando a espinha foi desinflamando e ficando um machucado vermelho e ainda grande, mas não tão feio quanto a espinha que estava lá antes. mas ainda sim era feio. não consegui tirar essa imagem toda vez que via o cara. da espinha. do machucado. da nojeira que era aquilo. voltei de viagem. cocei a a cabeça e senti duas espinhas grandes nascerem no pescoço. que merda.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

vultos

eu queria que por um momento as coisas parecessem reais. que não fossem esses vultos de esperança que vêm e vão. não entendo muito do que se passa. queria apenas saber um pouco das coisas. aonde estou e pra onde devo ir. eu quero há muito tempo é que pare de doer. só um pouco. que tudo isso cesse. ou pelo menos se suspenda por algum tempo. procuro algumas certezas para minhas dúvidas.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

pocket

eu não consigo ler um pocket book. é muito estranho. é muito pequeno. é muito escroto. colocar um livro no bolso. isso é horrivel. a literatura deve encher uma mão. deve ser vista. a capa e a contra capa tem que ser mostradas. não dá pra esconder um livro. é como não lê-lo. não há nada mais irritante e satisfatório do que perceber alguém olhando a capa do seu livro e balançando a cabeça. fazer isso é igualmente perturbador e divertido. nos faz mais humanos. mais curiosos. um pocket book não. é a letra, é a palavra escondida. e pior, mutilada. o pocket book é dos pocket autores. é dos pocket leitores. é dos pockets frequentadores de shopping. o pocket book é o livro que não deveria existir já que pra aqueles que o compram não deveria ocupar tanto espaço. é uma afronta ao mundo. à memória dos livros. é o fim da literatura. só serve para pocket mentes.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

morte

eu confesso. vivi tudo que havia de viver. previ quase tudo que vai ainda acontecer. chorei as emoções que ainda estão para compreender. sou tudo aquilo que meu tempo bastou. a finitude sempre para mim se estendeu. muitos falaram do inferno, mas poucos compreenderam o que é. todos buscaram ao céu, mas eu sempre o neguei. de tudo que posso dizer, já foi dito. de tudo que pude pensar, não mais pensarão. a vida se fecha na medida que tudo para mim se abre. nada mais posso fazer e tudo menos quero desfazer. do alto da torre sussurrei. do fundo do poço gritei. e aqui anunciada a chegada de minha morte, digo com toda certeza. estou à beira da vida.

domingo, 20 de junho de 2010

sujo

eu não lembro bem como tudo aconteceu. lembro do comboio, dos rapazes parando na estrada para abastecer, do sanduiche mal feito que comi, da luz do sol refletindo no espelho, das piadas que contavam com o vento insistindo em não nos deixar ouvir, lembro do concerto de vivaldi que estava na minha cabeça. mas não lembro como começou. do nada os tiros começaram, me abaixei para ver, consegui contar sete deles. éramos nove. em toda a história essa era parada fácil pra gente. caíram três de lá em dois minutos. vi o angelo no chão. pegaram a perna dele. bruno o puxou para o canto e deu seu lenço pra ele amarrar na perna. do jeito que bruno era, ia pegar nojo do lenço depois e nunca mais usaria. mas não hesitou em dar para angelo. um irmão por um irmão. a regra. com a arma de angelo, bruno virara um cowboy. john wayne não faria melhor. ele acertou mais dois. o otávio pegou um deles que tentava fugir, no meio da rua. otávio era bom de mira. uma vez me lembro dele atirando em dois caras totalmente sem ângulo. eu queria me tornar cada um deles ali. mas eu tinha contado sete e eles esqueceram do último. ele tava atrás do balcão. não sei como, mas ele estava ali. o covarde esperou seus homens morrerem para tentar algo. o bruno tava levantando angelo pra levá-lo pra fora. eles não tinham nos contado. atirei. no pescoço. se ele não morresse ali, quando voltasse era homem morto. no mesmo instante, o bruno virou pra mim com o olhar de quem achava que eu queria ter atirado nele. "seu idiota!". e ele olhou pra trás. me olhou de novo mas com outro olhar. "obrigado, me salvou". sem falar nenhuma palavra. enquanto todos davam conta de angelo eu fui ver o que tinha acontecido. todos estavam cheios de balas. e o que eu atingi só tinha uma. a minha. era o sargento deles. que sargento de merda. eu o tinha visto uma vez numa feira. ele ainda estava vivo. ou ao menos por alguns instantes. vi o sangue dele sair pelo nariz. pela boca. pelos olhos. e um jato de sangue saindo do buraco da bala sujando a parede de trás do balcão. não atirei mais para calá-lo, eu queria ouvir suas últimas palavras. mas eu só conseguia ouvir no meio da voz rouca que falava e engolia sangue: "seu bastardo sujo! seu bastardo sujo!". naquele momento entendi. minhas mãos fediam a pólvora. meu rosto mudara. minha alma escurecera. meu braço não mais tremia. minha cabeça não mais duvidava. porém tudo se apagava. tudo pareceu claro naquele instante de horror. tudo tinha mudado. tudo. o cinza não existia mais. era o longo calvagar para a minha própria escuridão. eu sei que aquilo me valeria a condecoração inteira. mas para mim era mais que isso. mais que mais um significado nas minhas costas. aquilo me mudara a ponto de eu não conseguir não esquecer nada. exceto como tudo começou. mas sempre iria lembrar a partir do momento que começou. tudo agora fazia sentindo. tudo estava à minha frente. o tudo era isso. tudo era sujo. e eu me tornara um dos poucos a notar isso.

sábado, 29 de maio de 2010

meu

eu tenho problemas. sérios. nada me faz muito sentido. nada me faz muita falta. a vida é uma sequência de erros e arrependimentos. me dão uma coisa mas eu pago outra. o rei foi embora mas não foi esquecido. assim é a podridão dentro de mim. as palavras saem, mas nada significam. a vida é mais um erro. é mais um arrependimento. muito sentido nada faz. muita falta nada faz. nada é real, tudo se repete. os erros, os arrependimentos, a vida. eu vivo uma mentira. e das mal contadas.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

mundo

eu mergulhei nesse mundo decapitado. vi pela fechadura do tempo. as fronteiras que foram abertas. as tecnologias que foram testadas. as vias que foram criadas. esse é o futuro que nos empurraram. o novo mundo. mais um hotel que não podemos pagar. orwell. huxley. deckard. no compasso do ritmo lento da inexatidão precisa de nossos dias. a multidão de tristãos e isoldas. mortos enganados. a avareza da abundância estampada embaixo de cada marquise. a vida sufocada atrás de cada neon. a alma vendida em cada outdoor. e se dizem magnifícios. pujantes. desenvolvedores. o prato raso em que se come o que se cospe. sim, eles venceram. meu amigo, pelo cansaço, eles venceram.

domingo, 23 de maio de 2010

teatro

eu sei o que é isso. é uma mutilação. é gente fodida. fo-di-da. que não consegue parar meio minuto e pensar que tá fazendo a porra toda errada. egocentrismo, auto-exclusão, nanismo de humildade. verdadeiros abcessos do pensamento. é gente que se encaixa muito bem na sociedade, no welfare, e só faz merda. e aplaudem. aplaudem essa merda toda. esse teatro de horrores. de gente que não sabe se portar, não sabe ficar quieto, que adora encher a boca de merda pra falar. que não admite o próprio erro, o próprio desvio. gente que joga nos outros os problems que finge que tem e que sabe que são mentiras. mentirosos patológicos. crianças precisando de atenção. gente fodida da vida. fo-di-da.

sexta-feira, 5 de março de 2010

garcia

eu lembro da primeira pessoa famosa que eu escutei ter morrido. jerry garcia. em 1995. com um botafogo quase campeão. jerry garcia. eu achava uma pena porque o nome me parecia ser alguém brasileiro. e quando um brasileiro morre, todos ficam chateados, e eu era um deles. mas o jerry, ou o garcia, não era brasileiro. e eu demorei pra entender isso. como alguém que tem um sobrenome brasileiro não é brasileiro. quando fiquei mas velho e precisei de um dicionário de inglês corri pra minha mãe perguntando qual era o nome da banda daquele jerry garcia. ela não sabia. perguntei para o meu pai. e ele também não sabia. um tio me ajudou. grateful dead. corri para o dicionário e decifrei. agradecida morte. durante anos eu escutei falar que era uma das grandes bandas do mundo nos anos 60. que tinha um dos melhores discos gravados. eventualmente demorei mais alguns anos para enfim escutar a banda. hoje mais do que nunca sinto falta de jerry garcia. eu ainda não entendo como sinto falta dele. mas ainda vou demorar para entender como a gente sente falta de quem a gente não conhece.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

coca

eu bebo whisky com coca. qualquer whisky. mas só pode ser com coca. nada de pepsi. não. tira da minha frente essa merda de rótulo azul. bebo porque gosto e porque preciso. bebo porque preciso esquecer. e bebo porque preciso lembrar. pois em todos os momentos eu bebi isso. para esquecer de tudo. mas no dia seguinte sempre me lembrava de algo mais. bebo porque é suave. porque desce bem. bebo porque é com whisky. bebo porque é com coca. se mulher tivesse esse gosto. eu morreria de cirrose. mas provavelmente vou morrer mesmo.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

oportunidade

eu não sei se quero perder isso tudo. se é que algum dia aquilo me pertenceu. sei que vou sentir saudade. mas sei que a vida não volta. que não se pode perder a oportunidade. mas vou sentir falta. mesmo estando perto. as coisas vão acabar. acho que será melhor assim. de longe. ver o fim sem me magoar. eu ainda não falei para ninguém. mas, pois bem. deixa estar.

paris

eu lembro de uma paris chuvosa. como talvez deveria ser. sem se ver um palmo à frente do rosto. somente se vê a torre. os carros embaçados. franceses chateados com a chuva. eu no meio da avenida achando tudo muito bom. assim deve ser paris. uma foto desfocada. pela metade. cheia de pingos d'água. assim deve ser a nossa vida. mal retratada. para poder ser imaginada.

esbarro

eu vejo pela janela uma mulher. quatro andares embaixo de mim. nesse frio abafado. me pergunto se foi importante vê-la. se me lembrarei dela. se a encontrarei sem saber que ela era a menina da janela. parte do mistério dessa vida é deixar as coisas para o acaso. para o esbarro. para depois ela me ver no mesmo andar.

momentos

eu não tenho todas essas fotos. ainda não compartilho todas essas memórias. todos esses pequenos momentos. todos esses grandes instantes de nossas vidas. parados. conservados. congelados. para se verem livres em nossas mentes. essa vida que vivemos. esses fatos que somamos. é isso que somos. momentos. retratados no espaço e no tempo.

quinta

eu preciso ir. não sei bem porque. aliás sei. é uma fundação estúpida. mas não é por isso. é por algo que não sei. algo que valha outro algo. toda quinta e nada. mudo de lugar mas o espaço é o mesmo. preciso de algum significado. não esse vazio. penso nela. daqui e de lá. não posso deixar nenhuma das duas escapar. tenho que fugir para isso. sou zarathustra. preciso esquecer para lembrar.

brigite

eu agora sei porque fui lá. fui tentar ter algo que nunca tive. a vida vivida. ela é brigite. 10 anos à minha frente. 10 vidas vividas. o suor. o beijo. os fluidos. de outros homens. que não eu. a vida vivida. ela é brigite. a efervescência de quem já rodou meio mundo. a leveza de quem já sabe tanto. a beleza das marcas do tempo. ela é brigite. mulheres. mulheres vividas. mulheres da vida. elas e brigites.

mundo

eu estou às voltas com o meu passado. tudo gira e volta. fotos. momentos. sorrisos. tudo isso parece tão claro quanto insípido. uma foto me fez lembrar. 2000. eu ainda era nada. e tudo já se movia. como posso pensar nisso tudo? dez anos atrás. dez verões. dez temporadas sem brigite. algo nela me trazia o mundo lá de fora. algo nela me trazia a vida que cospe. os segredos de viagens. as histórias de motéis. os amores de rodoviária. a vida. a vida era aquilo. aquele sutiã tamanho GG. aquela calcinha transparente. aqueles pêlos pubianos a mostra na piscina. sem pudor. como se estivesse em qualquer praia do mediterrâneo. eu vi o mundo pelo corpo desnudo dela. é isso que é o mundo. uma mochileira de 25 anos se depilando nua na beira da pisina.